Avançar para o conteúdo principal

Contingência

A última vez que a minha filha esteve por uns dias em reclusão foi há precisamente 4 anos. Época de Páscoa e a miúda apanhou varicela. Esteve precisamente 7 dias sem ir à rua e confesso que a meio da temporada, já quase me subia pelas paredes. Tinha 5 anos e não é fácil dizer-lhes que não podem sair.

Mas essa não tinha sido a primeira vez. Essa, tinha ela apenas 9 mesinhos e foi dos maiores sustos que apanhei na vida. Sim, a minha filha e eu própria já estivemos num quarto de hospital de isolamento, daqueles em que os médicos só entram vestidos de “astronauta”, quase inócuo. A miúda ligada a uma série de monitores, eu, mãe de primeira viagem ali trancada com ela, e as visitas, salvo raras excepções acenavam-nos do outro lado do vidro. Na verdade essa reclusão acabou por ser mais penosa para mim, mas foi necessária. Ainda estou para saber como é que consegui dormir alguma coisa aquelas noites sentada num cadeirão do Hospital da Estefânia. Depois do isolamento hospitalar, seguiram-se mais umas semanas de isolamento em casa, aí só para ela. Passei umas semanas em casa da minha mãe, ia trabalhar, quando chegava a casa antes de tudo tinha a tal rotina que nos pedem agora de deixar os sapatos à porta, tirar a roupa e pôr para lavar, tomar banho e só depois me podia aproximar da miúda.

Na verdade ela não teve mais do que um Exantema Súbito/Herpes6 ou Sexta Doença como também lhe chamam, mas o verdadeiro problema foi o facto do vírus lhe ter apanhado o sistema imunitário de tal forma que os glóbulos brancos foram literalmente ao ar, bem como as plaquetas, o que fez com que corresse sério risco de vida se apanhasse uma simples constipação. O isolamento não me custou, foi necessário pela saúde dela, mas confesso que quando tudo acabou, seja neste episódio aos 9 meses, como no episódio da varicela, as primeiras saídas à rua pós doença souberam a um prémio da lotaria.

Hoje tive que sair. Em menos de meia hora fui a casa da minha mãe, deixei a minha filha um bocadinho sozinha e fui lá deixar leite e afins. Pela primeira vez não dei um beijo à minha mãe. Deixei as coisas no patamar e ela depois recolheu. Voltei para casa, não senti a liberdade que tinha há apenas 15 dias atrás. Mas é o necessário e nos momentos mais complicados que esta reclusão nos faz sentir temos que acreditar que vamos sair desta e muitos vão aprender a valorizar-se, a valorizar o outro, a respeitar....não se vão operar milagres, mas quero acreditar que talvez a Humanidade retire daqui alguma lição. É uma guerra contra um ser microscópico e sem inteligência que está a conseguir devastar países inteiros, mas talvez acabe por ensinar a muita gente o que de facto importa e que a vida é tão breve que devemos fazer o bem, não vale a pena estarmos cá por menos do que isso.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Já começo a sentir o cheiro a férias...

Embora esteja a braços com uma bela gripe de Verão; antes agora, do que daqui a uns dias.

Folder "Para quê inventar" #6

 Também existe quem publicite "Depilação a Lazer"!  Confesso que quando olhei há uns dias para uma montra de um instituto, salão ou lá o que é de "beleza" fiquei parada por alguns momentos, não sabendo bem se deveria benzer-me, fazer serviço público e ir avisar as pessoas que aquilo estava mal escrito ou pura e simplesmente, seguir o meu caminho. Foi o que fiz, segui o meu caminho, porque na realidade não me foi perguntado nada, portanto não vale a pena entrar em contendas com desconhecidos à conta de ortografia. Mas...."depilação a lazer" é mesmo qualquer coisa! Para mim, não é mesmo lazer nenhum e posso confirmar que provoca até uma sensação algo desconfortável no momento, que compensa depois, mas daí a ser considerado lazer, vai uma distância extraordinária.

RIP - Seja lá isso o que for

 Sabemos lá nós se o descanso será eterno, ou mesmo se haverá esse tal descanso de que tanto se fala nestas situações. Sei que estou abananada. Muito. Penso na finitude e de uma maneira ou outra, já a senti de perto. A nossa evolução desde o nascimento até à morte é um fenómeno ambíguo e já dei comigo a pensar que sempre quis tanto ser mãe, que me custou tanto o parto da minha filha para lhe dar vida e que ela, tal como eu, um dia deixará de existir. Não me afecta a minha finitude, já desejei o meu fim precoce algumas vezes, mas não lido com pragmatismo com o desaparecimento de outras pessoas, nomeadamente das pessoas que me dizem ou até disseram algo. Hoje, deparo-me com uma notícia assim a seco e sem preparação prévia. Mas como é que um colega de quem recebi mensagens "ontem" pode ter morrido!? E vem-me sempre à cabeça aquele tipo de pensamento: "mas eu recebi ontem um email dele", espera, "eu tenho uma mensagem dele no Linkedin", "não, não pode, en...