Outubro Rosa = O mês que me tirou uma avó, que me deu uma filha…e que este ano me fez pensar, pensar ainda mais
Não digo que tenha sido um pesadelo, mas foi mais um murro a seco que levei…no corpo todo.
Agora está muito na moda as pessoas fazerem a analogia das voltas ao sol quando cumprem mais um ano de vida. Eu detenho-me mais em ciclos e momentos de vida, que não idealmente os relacionados com planetas e estrelas.
E por isso o mês de Outubro quando chega com a sua imprevisibilidade atmosférica traz-me à memória a última vez em que vi a minha avó e a tristeza com que vivi os seus últimos dias; por outro lado sorrio ao recordar que engravidei da minha filha neste mês e igualmente soube que a carregava no ventre.
Foi o mês que me tirou um Tudo, mas me presenteou com outro muitos anos depois.
Para mim estava arrumado. Já bastava de memórias para deixar no mês X do calendário gregoriano.
Mas a vida está sempre a surpreender e só no início do mês consegui fazer uns exames de rotina que me haviam prescrito a meio do Verão. E com eles juntei mais um item de memória que lhe vai estar sempre associado, até por ser curiosamente o mês escolhido para simbolizar a prevenção do cancro da mama, o Outubro Rosa que, neste ano, foi cinzento.
Entrei naquele dia 3, há pouco mais de duas semanas atrás na sala da mamografia, descontraída. Não é um exame que goste de fazer, mas é necessário. Quando me apertam a mama esquerda senti dor, mas não me queixei. Aqueles apertos custam e talvez estivesse mais sensível. Estava ali por rotina…nada mais.
Seguiu-se a ecografia mamária e aí, a minha presença de espirito e capacidade para lidar com o mais ou menos desconhecido, foi posta à prova. Eu observo muito, estou atenta aos detalhes e por muito que os médicos estejam habituados, há expressões faciais e olhares que não enganam, e, quando os meus olhos cruzavam os dele, enquanto percorria a minha mama esquerda vezes sem conta com o rolo, ele desviava e olhava para o ecrã com muita atenção.
Nada dizia e eu…muito menos. Passou para a direita, esteve uns momentos de volta dela, suspendeu, respirou fundo, olhou para mim e disse:
“Então é assim, temos que conversar acerca de uma situação….”
Eu deitada, literalmente em topless a olhar para ele com uma calma de morte. E ele continuou dizendo que tinha surgido no quadrante superior esquerdo um nódulo com cerca de 6mm, que não estava a gostar da aparição do mesmo dado que no último exame não estava lá, mas ao mesmo tempo vinha a parte positiva em que me dizia acreditar que não se tratava de nada grave, mas que deveria fazer uma ressonância e eventual biópsia, dependendo do resultado da ressonância, para ficar descansado.
Disse-me para não demorar muito, um mês no máximo. Mas não fique triste, pode ser excesso de zelo meu, não gosto que apareçam coisas de repente mas vai estar tudo bem.
Ninguém fica bem com um prognóstico destes, sobretudo com a minha idade, e os antecedentes familiares com taxa de sobrevivência = zero.
Saí de lá tranquila, com a tal calma de morte. Tão tranquila que até me confunde. Partilhei a notícia com meia dúzia de pessoas em quem confio plenamente e que me deram o colo e o conforto de que precisava naquele momento. Pessoas pragmáticas que não dizem parvoíces irreais como se o cancro só tocasse aos outros mas que me falaram sempre com esperança: em primeira instância no diagnóstico complementar e caso o cenário fosse o mais grave….a confiança na ciência.
A mim deu-me para a racionalidade. Pensei sobretudo na minha filha e no desafio que ela poderia ter que viver nos próximos tempos.
Foram dias de apreensão, incerteza, dúvidas e pensar que caso corresse mal, talvez a minha decisão face aos passos seguintes não fosse a mais óbvia e aceitável perante os meus. Pouco falávamos no assunto, apenas que a data da Ressonância se aproximava e chegou.
Não tive medo, mas senti-me só perante a perspectiva de uma doença má e mesquinha. Fui tratada que nem uma princesa por técnicos e enfermeiros. Uma hora deitada de barriga para baixo numa máquina que produz barulhos irritantes, mas com os phones que me puseram com músicas simpáticas. A minha respiração estava tão forte que acabou por prejudicar o exame e tive que a acalmar.
Sair, vestir, recobro, retirar cateter e lá saí a apanhar aragem fresca no rosto e a pensar que algo em mim não voltaria a ser igual. Fosse qual fosse o resultado.
O resultado chegou hoje mesmo: BI RADS 1
Não encontraram tradução do nódulo apanhado na ecografia mamária, neste exame, e portanto a total ausência de adenopatias. Tive que reler e agradeci nem sei a quem especificamente, mas agradeci por esta dádiva e prolongamento de vida. Pela minha filha sobretudo.
Agora é esperar pela opinião do meu médico e virar esta página, pois mais desafios estarão para vir.
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