Foi como me senti, e continuo a sentir um peso por ter feito algo que não devia aos olhos da Lei. Ao longo destes 43 anos e picos de vida tenho aprimorado qualidades e tento ver-me livre dos defeitos possíveis. Alguns são-nos tão intrínsecos que é complexo e difícil deixar de os ter...mas tento, faço um esforço e alguns pertencem ao passado.
Vivo a rezar para que não me chateiem, para ser o mais anónima possível, para ser esquecida. As únicas pessoas que verdadeiramente importam estão no meu núcleo e não saem, mesmo que numa outra dimensão. O resto nem acessório é...é nada.
Mas voltando ao início, para não me perder, para conseguir exorcizar alguma culpa, fazer a minha catarse. Andamos neste confinamento louco mas necessário há meses. Há meses que teoricamente não posso sair do meu Concelho de residência ao fim de semana. Há um Decreto-Lei aprovado em assembleia da república e eu...faço por ser uma cidadã cumpridora. Mas até o mais Santo, num certo dia...peca. E eu confesso que este segundo confinamento feroz me está a pesar mais do que o primeiro. Sinto-me cansada. Sinto-me desmazelada. Estava com a minha depilação a laser por fazer há meses. É um acessório, não é algo de força maior, mas para mim, fez toda a diferença. Tinha a minha marcação adiada há 2 meses e ontem...fui. Literalmente à margem da lei. Pensei que se a Polícia me interpelasse, teria 2 hipóteses: dizer a verdade, ou seja, que tinha um tratamento estético marcado, ou mentiria, dizendo que tinha que ir ao escritório buscar qualquer coisa (tenho uma declaração de circulação que mo permite e aquilo que fui ontem fazer é precisamente no mesmo concelho, que faz fronteira com o meu de residência).
Cá com os meus botões não tive dúvidas em saber que diria sempre a verdade adviessem daí que consequências fossem. Cumpri com o que cumpro sempre. Fui sozinha, máscara FFP2 na cara, entrei, fiz o que tinha a fazer, saí e regressei. Na ida tudo pacífico, na volta vejo ao longe 2 “Checkpoint”, mas não o Charlie, que não afectaram o meu trajecto.
O coração bateu. Senti-me uma marginal, fora-de-lei. Não consigo mesmo mentir, prevaricar. Que sentimento de culpa. Mas como é que vivemos com estas restrições sem uma ou outra fuga. Não fui nem vou a festas, não convivo com os meus amigos há um ano, não estou com a minha mãe há meses...para esses é preciso tempo de qualidade, toque, beijos e abraços, qua a situação actual não permite.
Fui ao laser...algo que durante a semana, por estar a trabalhar não posso fazer, resta-me o fim de semana, que há meses anda restringido ao concelho em que vivo. Não fiz o que estava correcto, mas acredito que a excepção não é das mais gravosas, e aqui retornei à reclusão necessária para os próximos tempos. Mas pelo menos, com menos uma camada (de pêlos) desnecessária em cima da pele.
Mas a culpa vai manter-se aqui a remoer o meu espírito e penso, como é que anda por aí tanta gente cruel, mentirosa, de má índole, a quem não lhes assola um ínfimo sentimento de culpa pelo mal que fazem aos outros. Estágios de desenvolvimento pessoal digo eu, que para muitos ainda vai na pré-História.
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