Este dia foi sempre muito falado lá em casa quando era apenas uma menina. Sempre ouvi a minha avó dizer que na sua infância era apenas neste dia que recebiam algum presente (poucos acredito data a dureza da época e, apesar da minha bisavó naqueles idos anos 30 do século passado ser enfermeira, o ter enviuvado ainda na casa dos 30 anos e com 5 filhos muito pequenos não lhe tornou a vida próspera).
E então, quando eu era pequenina, no dia de Reis sempre houve a tradição de se abrir um bolo rei lá em casa - a minha avó ainda auspiciava deixar a mesa posta do Natal aos Reis para que os "ausentes" também pudessem usufruir das nossas iguarias mas a minha mãe já não ia nessa conversa.
Também deixava um copinho com leite e umas bolachinhas para o Pai Natal comer e levar ao Menino Jesus e também sempre ouvi falar na Tia Reis (irmã da minha avó que, por ter nascido no dia de Reis, não mais se livrou da epifania ao ostentar o tão pomposo nome de Maria dos Reis).
E guardo tudo na minha memória, com saudade, pois estes tempos não voltam mais nem tão pouco a ilusão que, apesar de tudo eu tinha com e pelo Natal.
Imaginava as coisas mais incríveis, desde a simples boneca que cobiçava, o brinquedo, e até que o meu pai aparecesse, qual D. Sebastião na épica manhã de nevoeiro.
Nenhum dos meus sonhos de Natal se realizou e, com o partir de pessoas chave para a minha vida, mais me desliguei do Natal e de alguns rituais pagãos que lhe estão associados.
Poucas mensagens envio a desejar Bom Natal, poucos telefonemas faço - aborrece-me e acho que hoje em dia o Natal significa muito pouco, mesmo para aqueles que se renderam à época louca e se esqueceram do que de facto significa o Natal.
Lembro-me de estar grávida da minha filha e na altura do Natal, do ano em causa ainda era "segredo", só poucas pessoas o sabiam, e destas, as mais intimas e, a dada altura, a ex-mulher do meu padrinho de baptismo me ter dito que não obstante me estar a ligar para desejar um Feliz Natal, estava a desejar-me felicidades, porque estava prestes a viver o meu Natal...de facto.
E assim foi, quando nasceu a minha filha, talvez todos os sonhos de menina que tive, foram realizados ao ter gerado e dado à luz aquele ser humano magnífico, perfeito e indefeso.
Tal como o Menino Jesus o foi para Maria há mais de 2000 anos atrás.
Isso é o Natal, o resto, são tretas. Ah, e já agora, apaguem as luzes irritantes das janelas, retirem as coroas pirosas e bonecos de neve das portas de casa e comportem-se como sempre - sem empatia, preocupação e respeito pelo próximo.
Não é nenhuma zanga com Deus, com o Menino ou com alguém - é apenas o choque com a realidade e a tomada de consciência de que o actual estado da sociedade em geral e da maioria das pessoas em particular é completamente abjecto.
De resto, que os poucos restantes que merecem, tenham sempre um Feliz Natal, aquele que é mesmo Natal, amor, compaixão, partilha, família, amizade, esperança, fé....e que os Reis tragam juntamente com as suas oferendas, muita paz de espírito e serenidade.
...que venha a Páscoa!
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