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O que aprendemos com os volte-faces da vida

 Não que ao longo destes longos 45 anos eu já não tivesse aprendido umas coisas, mas tal como a Nossa Senhora apareceu a seu tempo aos Pastorinhos, as revelações vão-nos sendo desvendadas a seu tempo.

Estive fora de circulação durante uns meses, algo que nunca me tinha ocorrido desde que entrei no mercado de trabalho, e já lá vão mais de 20 anos. 

Fui acometida pela doença, essa malvada, doença essa com pressupostos incompatíveis com o trabalho. Perante o choque inicial, que para mim não foi assim tão chocante, pois há muito que interiorizei que as coisas menos boas não acontecem apenas aos outros, o que me fez ficar mais sorumbática foi a sensação de quase inutilidade: não poder descurar o meu papel de mãe, mas por vezes ter que fechar os olhos a algumas coisas, ter que ser ajudada para outras e ter que parar durante longos minutos para o simples acto de raciocinar e não perder capacidade psíquica.

Foi um challenge e foram meses peculiares. Estar de férias é simpático, de fim de semana também, mas estar de "baixa", sendo que a esse termo está associada a doença, é complexo.

Não sabia estar sem horários durante semanas a fio, não sabia como se processava a parte burocrática, a Segurança Social nos entretantos perdeu o meu processo e eu meses sem receber o subsídio, e as contas a chegar a casa para pagar e uma pré-adolescente a crescer e a necessitar ora de ténis, ora de material escolar extra e acima de tudo de muito alimento e eu a perceber que, fazendo falta, se os desígnios fossem ainda mais dramáticos, seria o caos.

Poder-se-á alguma vez na vida substituir o papel de uma mãe/pai daqueles a sério, que como eu, se preocupam com os seus filhos e os têm na sua lista de prioridades? Não creio.

E ter que lidar com uma jovenzinha que de parva não tem nada, dizer-lhe que está tudo controlado e ela olhar de lado e perguntar: "não vais morrer, pois não mãe?" 

Se eu tossia ou dizia um "ai" lá vinha ela com o coração nas mãos e eu continuava a dizer que estava tudo bem, embora o meu olhar não minta.

Foram meses duros; não só os que tive que parar, como os que antecederam essa quebra, essa fractura que foi necessária.

E aí, mais uma vez foi época de limpeza. Mais umas quantas pessoas que provaram de que raça são feitas, para o bem e para o mal. Tive surpresas boas, daquelas que sem grandes afinidades me mostraram que estão lá e o inverso. E se as surpresas boas nos aquecem o coração, as más doem, doem muito.

Mas a verdade é que doem cada vez menos. Muito naturalmente me desconectei das tais pessoas que não sabem o que é a amizade, o carinho, o amor ao próximo, o afecto e liguei-me a quem de facto, parecendo estar a uma certa distância, todos os dias teve uma palavra, um gesto, um apoio neste meu período mais negro. Estou mesmo muito grata, nunca conseguirei fazer o suficiente para agradecer a quem me ajudou neste processo, estando lá, incondicionalmente. Tal como não esquecerei os abraços sinceros que recebi no meu regresso, os sorrisos genuínos com lágrimas nos olhos de pessoas que, uma vez mais, não esperava tamanha manifestação de ternura e o empurrão que precisava para me relembrar de como é viver de novo e com a normalidade possível do dia a dia.

Já passou....já passou! Mais uma couraça conquistada porque tudo, quando de facto temos essa humildade, nos deve servir para aprender.

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