Tenho observado atentamente toda a problemática em torno do beijo consentido ou não do presidente da real federação de futebol de Espanha à jogadora da selecção.
Honestamente toda a celeuma já aborrece e chega a ser indecente o aproveitamento em todas as suas perspectivas. Falo enquanto mulher, enquanto mãe de outra mulher, enquanto irmã, cidadã, enquanto vítima de assédio e não só…e claro, enquanto cientista social.
Vejamos: o indivíduo em si não tem a mínima noção do lugar que ocupa em sociedade e que a liberdade dele termina quando atinge a fronteira do outro. Depois não sabe igualmente que um beijo é algo íntimo; não me venham com terminologias que agora andam aí na berra, brejeiras como tudo. Um beijo nos lábios é o primeiro reduto de intimidade que se pode ter ou experienciar com alguém. O mesmo, pode ser desejado, ou não. Pode ser, ou não, bem recebido. Pode ser bom, ou não.
Em suma, o indivíduo em questão é um burgesso, do mais sabujo que há, analisando todo o seu comportamento naquele evento.
Mas não vejo que a visada seja, por si só, tão vítima, como a querem fazer parecer. Foi surpreendida? Talvez. Mas a linguagem corporal da mesma tão pouco é de alguém que se sentiu tão violada na sua intimidade. Se assim fosse, porquê àquela jogadora em especial e não a outra. Não tendo apreciado, porque sai daquela cena evitável a rir e depois em balneário e em autocarro se vê a mesma “vítima” a brincar com a situação e a fazer comparações com o que fez um casal de namorados numa outra memorável final, corria o ano de 2010?
Parece-me bastante contraditório uma pessoa ofendida, cuja linguagem corporal não indica qualquer tentativa de afastamento nem de repúdio a posteriori se manifeste dizendo que não consentiu o tal beijo.
Portanto estamos aqui perante situações que jamais deveriam ocorrer, mas em vertentes várias, e não só pela parte do opulento dirigente que tem em si todos os focos e continua a ser linchado porque também fica bem que as mulheres sejam as vítimas e oprimidas. Bolas, sou mulher, o indivíduo é um nojo, mas não fiquemos com a visão e a inteligência turvas.
Sim, já fui beijada contra a minha vontade e não gostei. Nunca o fui por um superior hierárquico, mas fui por alguém que tinha pelo menos mais força do que eu. E ninguém me viu a brincar com a situação, muito pelo contrário e deixei bem claro que a situação não se voltaria a repetir.
Também já fui alvo de um ataque de cariz sexual há uns bons anos atrás; num local público, à luz do dia, a sair do carro, aproxima-se de mim o epíteto “do homem da gabardine” mas sem a mesma, e com a sua genitália toda à vista. Valeu-me alguma presença de espírito, já ter trabalhado numa prisão, onde acabei por lidar também com este tipo de criminoso, uma finta que me correu bem, a minha memória que conseguiu fixar-lhe a matrícula do carro e ir directa ao Segurança mais próximo que prontamente chamou a polícia e aí…quebrei. Não é uma abordagem interessante, de todo.
Nisto, contei a algumas colegas o sucedido, e a atitude delas foi rirem-se imenso e achar imensa piada e ainda alvitrarem que eu deveria ter dito que a genitália do indivíduo era isto e aquilo. Perdoem-me a comparação mas é o que parece toda esta celeuma. Um bando de idiotas de ambos os lados.
Curiosamente a vítima seguinte deste mesmo indivíduo, algum tempo depois, foi uma das que se riu do meu infortúnio, o que na altura me fez dizer-lhe que nesse caso ele tinha escolhido mal a vítima, já que pelos vistos ela gostaria de ser incomodada por um indivíduo tarado. Mas quando de facto foi ela a vítima, percebeu que a situação em si é mesmo no seu género, traumatizante, até porque naquela fracção de segundos, não sabemos o que um ser destes com um carro a trabalhar no meio da estrada, é capaz de fazer a seguir.
Portanto, tudo isto para concluir que me confunde sobremaneira o meu senso científico reacções contraditórias face a actos e factos de que não se gostou. E é também por estas que nós, mulheres, não somos de facto todas iguais.
Neste caso temos sem dúvida um burgesso mal educado e uma mulher que tão pouco sabe estar e fazer jus à sua honra adoptando uma postura credível.
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