Creio que nos próximos tempos muito irei eu dissertar acerca do tema, mais em modo desabafo e constatação. Mas antes de lá chegar, convém começar pelo início.
Naquele dia 04 de Julho de 2010, não sei bem precisar a hora exacta, porque os minutos que se seguem a um parto são complexos. Só mesmo quem está presente consegue perceber. Acredito que quando se trate de um parto com complicações várias...muito pior.
Mas após nascer para a vida pelas 15:48h e todas aquelas manobras iniciais, índice de APGAR incluído em que teve uma classificação de 9-10 (aos 1º e 5º minutos) veio o primeiro contacto a sério comigo que, entre perda de consciência algumas vezes da minha parte, do que me lembro é de a ter em cima de mim, de barriga para baixo e cabecinha de lado, os olhos muito abertos e rasgados a fitar-me muito séria.
Ouvi-a os médicos muito aliviados a chamarem-me para a vida e a falar algo alto e retenho até hoje na minha cabeça: "Tânia, conseguiu, conseguimos! A sua bebé é linda, ela é linda!"
Eu, meio alucinada e com a sensação que havia sido atropelada por um semi-reboque olhei para ela, viro-me e pergunto a que horas ela nasceu (ainda hoje não entendo esta parvoíce), dou-lhe um beijo na testa, conto-lhe os dedos das mãos e dos pés (outra estupidez) e só depois olho novamente para ela, a medo. Olho-a nos olhos. Ela não pestanejava, naquele momento estava muito calma e serena, mas olhava para mim com uma profundidade que me assustou. Tive medo daquele ser humano indefeso acabado de nascer; pensei: "este ser humano que saiu de mim, existe e depende inteiramente de mim, mas olha-me com uma determinação que me chega a perturbar".
Nada seria como antes. De facto na minha vida existe um AAR e DAR - ou seja, antes da Ana Rita e depois da Ana Rita.
E todas as fases de desenvolvimento têm sido um desafio; quando penso que passámos o stress das primeiras noites de um bebé em casa, vêm as cólicas, depois a passagem dos alimentos líquidos para os sólidos, dentes.....até à temível adolescência.
A adolescência é mesmo temerosa. Eu já a vivi na pele, com todos os seus predicados. Vivi-a também como filha, na forma como via a minha mãe, avó. padrasto e até a minha irmã que não passava de uma bebé, lidarem comigo.
Sim, tive os meus maus momentos, embora os tempos há 30 anos atrás fossem outros e a irreverência da juventude fosse uma menina, comparativamente com a irreverência de hoje. Até essa cresceu, entenda-se, a irreverência.
Agora vivo a adolescência da minha filha, mas tento sempre ser sensível ao facto de que também eu o fui e rever-me nas suas atitudes, nos seus humores, relativizar certas coisas, outras até fingir que não vejo. Mesmo assim não está fácil, porque aquele olhar determinado com que nasceu desafia-me, as questões que me coloca são transcendentes e por vezes, parece que estamos em permanente duelo ideológico.
E fico cansada, esgotada, porque ela não desiste e desafia e refila e rebate e queixa-se e resmunga...mas depois, no fim de tudo, continua a ser um doce.
Vão ser assim os próximos anos.
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