Avançar para o conteúdo principal

Situações perturbadoras

 Transito na Marginal (N6) regularmente, na verdade, quase diariamente. Sempre foi uma estrada complicada para mim e após ter obtido a carta de condução, só passados uns bons 5/6 anos é que me atrevi a conduzir naquela estrada pela primeira vez.

Tem a fama que todos sabemos, tem troços perigosos, mas o que me perturbava era, e continua a ser, embora que com outra distância, o facto de ter falecido ali, encarcerada no carro a minha tia Zé.

Tinha na altura 30 e poucos anos, 2 filhos na minha faixa etária e foi das primeiras pessoas assim próximas de quem conheci a morte, que a percebi no sentido da finitude e do seu desaparecimento eterno, que vi o sofrimento do meu padrasto que era irmão e que também já havia perdido um filho com 11 anos noutro acidente de viação, vi o sofrimento dos pais...dos filhos. 

Marcou-me um episódio em que estava com os meus primos de férias e dizer que estava com saudades da minha mãe...olharem para mim e perguntarem: "E nós....?"

A verdade é que aquele acidente sem culpados, isto porque se provou que foi uma outra viatura envolvida no acidente que o provocou e cujo condutor se escapuliu deixando algumas pessoas entregues à sua morte, me marcou para sempre.

Quando finalmente consegui desbloquear aquela sensação e passei a transitar normalmente na Marginal, já se haviam passado muitos anos desde a partida da tia Zé, mas não há uma única vez que lá passe, que não me lembre dela.

Hoje, mal entrei no carro, dava na rádio uma notícia de uma viatura que se acidentou e caiu ao mar e que entretanto tinham encontrado a vítima mortal muito encarcerada dentro do carro. Eu a circular por ali estava, passei no cenário, digamos que mesmo, teatro das operações e arrepiei-me. Pensar que estava alguém preso num carro, debaixo de água a escassos metros de mim. Que há poucas horas estaria a percorrer precisamente o mesmo ponto que eu e sabemos lá nós porquê foi parar ao mar e teve por certo uma morte horrível. 

Dizem ser um indivíduo com cerca de 30 anos, toda uma vida pela frente, iria fazer algo de útil para si acredito eu e a sua viagem, não terá regresso.

Não sei de quem se trata, mas fiquei num sofrimento e apoderou-se de mim uma sensação de mal estar que me acompanha até agora e não estou a ser capaz de me abstrair. 

Que raio de início de semana e que raio de feitio o meu que não me consigo desligar.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Já começo a sentir o cheiro a férias...

Embora esteja a braços com uma bela gripe de Verão; antes agora, do que daqui a uns dias.

Dia de Reis

 Este dia foi sempre muito falado lá em casa quando era apenas uma menina. Sempre ouvi a minha avó dizer que na sua infância era apenas neste dia que recebiam algum presente (poucos acredito data a dureza da época e, apesar da minha bisavó naqueles idos anos 30 do século passado ser enfermeira, o ter enviuvado ainda na casa dos 30 anos e com 5 filhos muito pequenos não lhe tornou a vida próspera). E então, quando eu era pequenina, no dia de Reis sempre houve a tradição de se abrir um bolo rei lá em casa - a minha avó ainda auspiciava deixar a mesa posta do Natal aos Reis para que os "ausentes" também pudessem usufruir das nossas iguarias mas a minha mãe já não ia nessa conversa. Também deixava um copinho com leite e umas bolachinhas para o Pai Natal comer e levar ao Menino Jesus e também sempre ouvi falar na Tia Reis (irmã da minha avó que, por ter nascido no dia de Reis, não mais se livrou da epifania ao ostentar o tão pomposo nome de Maria dos Reis). E guardo tudo na minha ...

Dia da Voz

Neste dia da Voz, não podia deixar de me lembrar da voz da minha saudosa avó Isabel, que não oiço ao vivo há 16 anos e meio, mas oiço no meu coração diariamente. Voz inconfundível, pessoa irrepetível. Foi a pessoa que de facto nunca me desiludiu, apesar da educação espartana que sempre fez questão de me transmitir. A si minha Avó!